terça-feira, 17 de maio de 2011

I - Fevereiro de 2010

Até fevereiro de 2010 eu não tinha nenhum ânimo para encarar a maternidade. Ter filhos me parecia mais uma obrigação social (desagradável, diga-se de passagem), do que um projeto de vida. Isso às vésperas de completar 29 anos, uma idade na qual as pessoas perguntam com mais frequência sobre os planos de procriar e os companheiros de faixa etária estão embarcando nessa. Não tem como não se questionar sobre querer ou não ser mãe.

E por essa época eu brinco que estava até fazendo listas de prós e contras para, sabe-se lá quando, fechar a contagem, somar os pontos e tomar a decisão. Eis então que vou ao dentista e tudo muda (!). Ok, não era um dentista convencional, mas sim adepto da Biocibernética Bucal, o meu querido Dr. Edison da Cunha Swain, falecido pouco mais de um ano depois desse nosso primeiro encontro.

Nessa conversa, que durou umas três horas, falamos sobre muitas coisas, mas tudo girando em torno das estruturas humanas, pessoais e coletivas, dos papeis do homem e da mulher, de como seria possível buscar um aperfeiçoamento para nos tornarmos de fato seres humanos. Não lembro exatamente o ponto que pegou a parte da maternidade, mas ele sempre enalteceu essa relação, mesmo porque trabalhava bastante com gestantes, mães e crianças, atuando nos partos, inclusive.

Para resumir a história, segue abaixo a transcrição de parte do e-mail que mandei pra ele logo depois da consulta:

Conversamos bastante na terça-feira e desde então suas palavras estão ecoando na minha cabeça! Gostei muito de tudo que ouvi, me pareceu muito coerente e me deu bastante esperança no mundo, pois, admito, eu andava cada vez mais descrente da humanidade; descrença esta que me desencorajava profundamente de ter filhos, por exemplo... pois bem, o senhor foi a primeira pessoa que me fez sentir que é possível ser mãe... que é possível conceber, gerar, parir e educar um filho no meio desse caos todo e que, mais importante que tudo isso, essa pode ser uma via para atuar positivamente no planeta.

Acho que essas palavras explicam o porquê do marco "fevereiro de 2010". Até essa data eu era uma pessoa, eu pensava de um jeito, eu sentia de um jeito e depois desse dia muita coisa mudou e foi mudando mais e cada vez mais rápido.

Você deve imaginar a força que teve esse encontro. Antes dessa conversa eu realmente não via como ter um filho. Eu simplesmente não entendia como as pessoas ficavam colocando gente no mundo, parecia que ninguém pensava no assunto e só respondia a um instinto biológico. Porque quando eu parava pra pensar em "o que é ter um filho", essa ideia não me animava e até me apavorava. Isso à luz do que eu via "por aí".

Até que uma pessoa me diz que o que eu vejo "por aí" realmente não é a melhor forma (disso eu já sabia e essa afirmação vale pra quase tudo...) e que é sim possível optar por outros caminhos, que até então eu não fazia a mínima ideia de que existiam. Na verdade não é nem questão de optar por outros caminhos, mas de encarar a experiência com a profundidade e a importância que ela merece e como isso pode ser transformador e benéfico para todos, da mesma forma como é prejudicial a todos a forma com que vem sendo feita... e esse é o começo da história!

segunda-feira, 16 de maio de 2011

II - Carol, Marcelo & Clara

Com o Dr. Edison eu tive uma experiência pontual e teórica, enquanto que com essa adorável família a experiência tem sido diluída e prática.

Em fevereiro de 2010 a Carol já estava grávida, mas isso ainda não contribuía para que eu sentisse vontade de estar também. Depois que comecei a encarar a maternidade com outros olhos, aí sim a experiência deles foi me interessando mais, fazendo inclusive com que eu estivesse presente no momento do parto.

Eu já disse que ver a Clara nascer foi revelador e transformador. O primeiro banho dela, de balde, foi a coisa mais linda que vi até hoje. Mais uma vez eu sentia que é possível.

Acompanhar o processo deles, de gravidez, parto e cada momento do desenrolar do crescimento da Clara, com certeza me economizou muito tempo e sofrimento. Tempo porque tudo já está chegando "mastigado" pra mim; por mais que eu vá procurar o meu próprio caminho, a direção é a mesma e assim tudo fica mais fácil. E digo que economizou sofrimento porque o aprendizado frequentemente é sofrido, a menos que aprendamos pela experiência do outro.

Graças à Clara agora eu sei o que é um parto humanizado, sei a importância que isso tem para a mãe e para o bebê; sei que existem fraldas de pano super modernas e práticas (e caras também, rs...); sei que faz bem para todos - mãe, pai e bebê - a cama compartilhada, ou seja, todo mundo dormindo junto no aconchego e segurança que a família proporciona, ao invés de um frio e solitário berço cheio de grades e os intermináveis "deita e levanta" da madrugada; sei que não precisa também ficar perguntando "até quando", pois isso simplesmente não importa; sei que o bebê deve mamar sempre que tiver vontade e que o melhor lugar para ele estar é o colo da mãe (ou outro, na ausência desse).

E foi também graças à Clara que eu conheci a Laura Gutman e seu arrebatador livro "A maternidade e o encontro com a própria sombra". Falo já sobre ele ;)

Queridos, obrigada por esse privilégio de aprender de forma tão gostosa com vocês!

domingo, 15 de maio de 2011

III - Então vamos?

Aqui entra mais um marco nessa história, que é o livro "A maternidade e o encontro com a própria sombra" (Laura Gutman). Se até agora eu estava vendo que é possível, com esse livro me bateu um sentimento de "ok, vamos lá".

O livro apresenta a maternidade como uma forma extremamente intensa de autoconhecimento. Segundo a autora, a sombra da mãe é expressa no filho, portanto tudo o que o filho manifesta de "incômodo" é uma materialização de coisas mal resolvidas na mãe. A mãe, por sua vez, pode optar por tentar entender a origem daquilo, o que não é fácil, pois se estava relegada à sombra é algo que não queremos lidar e que muitas vezes nem conseguimos acessar sozinhas; ou então pode ir optando por medidas paliativas, por culpar outras pessoas (o marido, a sogra, a própria mãe, o próprio bebê) e aí vai empurrando o problema, que vai se tornando cada vez mais grave, voltando a surgir em outros momentos do desenvolvimento da criança e do adolescente, culminando em adultos emocionalmente frágeis, que vão reproduzir esse padrão e aí, bem, e aí você sabe o que acontece, vide mundo.

Da forma como é apresentada, ou melhor, da forma como eu estou entendendo, a maternidade pode representar um expressivo salto evolutivo. Uma oportunidade única de mexer naquele porão embolorado, jogar as tralhas fora, abrir as janelas e deixar o sol entrar. A tarefa realmente não deve ser fácil... só de pensar meu nariz já coça e busco os lenços de papel. Mas uma bela faxina nunca me assustou e o resultado compensa os espirros e calos nas mãos.

Antes, quando eu não queria ter filhos, eu dizia que essa era uma posição totalmente egoísta, porque eu não queria sair da minha zona de conforto com relação aos rumos da minha vida, tanto cotidianos quanto de longo prazo. Eu estava muito bem com a minha independência e não queria "sarna pra me coçar".

Agora, que a coisa me foi apresentada de outra forma, com um caráter desafiador inclusive, continuo me achando em uma posição egoísta, mesmo que oposta à anterior... é que a vontade de ter filhos, no meu caso, tem a ver com a ideia de aprimorar o meu desenvolvimento enquanto ser humano, enquanto ser humana. Mas vendo assim não considero esse egoísmo negativo (nem sei se egoísmo é o termo correto), pois tudo o que eu quero é me tornar uma pessoa melhor. Não para mim, mas para o mundo. Eu já disse isso: eu quero que o mundo seja um lugar cada vez melhor e a primeira forma de viabilizar isso é que cada pessoa torne-se melhor.

sábado, 14 de maio de 2011

IV - Juntando as ferramentas

A minha personalidade exige que o planejamento esteja presente em minha vida. Na faculdade de Engenharia Florestal aprendi com o meu Professor João Batista que quem começa contando, começa errando. Explico: ele ensina métodos quantitativos e com essa frase ele quer dizer que quem simplesmente entra em uma floresta e começa a contar e medir árvores, já começou errando. Antes disso é necessário saber por que você está contando e como você vai contar, porque se você só fizer essas perguntas depois é muito provável que tenha que voltar e contar/medir tudo de novo. Isso não se aplica só para o trabalho de medir árvores...

Usando a metáfora do texto anterior, estou me preparando para uma faxina. Então preciso juntar os produtos de limpeza, os panos, os baldes, rodos, vassouras, aspirador de pó, sacolas para o lixo. Preciso checar se tem água perto. Preciso deixar alguma comida pronta pra não ter que parar tudo no meio e ir fazer o almoço (ou será que alguém vai fazer almoço pra mim?). E quando estiver tudo preparado, ainda vou colocar uma empolgante play list! Aí sim, entro no cômodo.

A faxina será tanto melhor quanto o número de faxinas que eu já tenha visto e/ou realizado, mesmo que tenha sido só como espectadora ou aprendiz.

Isso quer dizer que não vou esquecer nenhum item? Isso quer dizer que não vai acabar a luz ou a água no meio da faxina? Isso quer dizer que vou terminar na hora que eu tinha previsto? Não, não mesmo. Só quem é muito tolo acha que um bom planejamento elimina imprevistos.

Um bom planejamento deve te dar suporte para lidar com os imprevistos.

E cá estou eu, reunindo os saberes, preparando o terreno.

Outro sentimento que tive foi como se estivesse estudando pro vestibular. Eu realmente tenho me sentido assim, porque estou curtindo essas novas descobertas e sempre gostei de estudar. A fase pré vestibular foi muito legal! Eu não tinha pressão nenhuma e estaria tudo bem se passasse ou se não passasse, pois tinha todo o tempo do mundo para tentar.

Ao pensar assim imaginei que a gravidez seria o vestibular, as provas; o parto seria como o dia que você vai conferir a lista de chamada pra ver se passou; e o desenvolver extra uterino do filho uma faculdade, que pode evoluir para um mestrado, doutorado, pós doutorado, ou patinar em DPs até ser jubilado ou um pouco de cada, o que é mais provável.

Além disso, também acho que se aplica outra comparação: se você achava que estava aprendendo antes da faculdade, depois que entra você vê um mundo totalmente novo se descortinar e frequentemente seu pensamento anterior é desconstruído frente a novos conceitos e novos pensadores.

A data do vestibular não está marcada e fico imaginando o momento que eu direi "estou pronta". Sei que nunca estamos prontos, pois sempre há alguma coisa a lapidar, e esse pode ser um risco... o perfeccionismo pode fazer com que se perca o trem. E é também por isso que tenho olhado pra dentro; que tenho tentado ouvir os sons internos, pois são eles que dirão que chegou a hora.